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Fim do Reporto: um desestímulo

Liana Lourenço Martinelli
3 fev 2022

O veto presidencial ao Reporto, benefício tributário e fiscal que desonerava investimentos em portos e ferrovias, que havia sido incluído pelo Congresso Nacional no BR do Mar, projeto de lei que prevê um programa de estímulos à navegação de cabotagem, é mais uma contribuição do governo para agravar a situação da infraestrutura portuária. Como se sabe, o Reporto, criado em 2004, vinha sendo renovado de maneira sucessiva até que, em 2020, perdeu a validade, o que já vinha desestimulando investimentos privados no setor.

Com essa decisão do governo, os investimentos no setor portuário ficarão mais dispendiosos, pois haverá uma inevitável redução do poder de compra para máquinas, equipamentos e outros bens necessários para as infraestruturas portuárias e de ferrovias. Segundo o setor privado, a descontinuidade do regime a partir de 2022 vai representar uma tributação que pode, em alguns casos, chegar a 42% na compra de equipamentos portuários. Obviamente, isso resultará numa diminuição no ritmo dos investimentos na reestruturação e ampliação de terminais portuários e das ferrovias. Aliás, segundo cálculos do setor privado, pelo menos R$ 2 bilhões deixarão de ser investidos e haverá uma economia de apenas 0,01% em receita tributária no Orçamento da União.

O Reporto, como ficou conhecido o benefício, garantiria isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para a compra de máquinas e equipamentos, como trens e portêineres, além da suspensão da cobrança de Imposto de Importação sobre itens que não tenham similares nacionais. A desoneração também poderia incluir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dos Estados.

Para embasar o veto presidencial, o Ministério da Economia defendeu a ideia segundo a qual todos os regimes especiais devem ser tratados em conjunto, dentro de uma projetada reforma tributária. Ocorre que os projetos que preveem essa reforma tributária estão com tramitação praticamente paralisada na Câmara dos Deputados e no Senado. E, num ano em que serão realizadas eleições para deputados, senadores, governadores e presidente, é quase certo que essa decisão do Congresso seja postergada para 2023.

Não é preciso muita imaginação para se concluir que os esforços do Ministério da Infraestrutura, dentro do atual governo, poderão ter sido em vão na tentativa de reformular o quadro arcaico do sistema logístico do País. Afinal, o governo fez 121 licitações que representam R$ 650 bilhões em investimentos em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. E a expectativa era de que o setor privado viesse a aproveitar essa iniciativa para fazer altos investimentos. Afinal, a renovação do Reporto era considerada fundamental porque concessões recentes de ferrovias e novos contratos de arrendamentos de terminais portuários levavam em conta esse benefício fiscal no cálculo de investimentos exigidos.

Agora, sem o Reporto, o setor privado calcula que a aplicação dos tributos poderá encarecer em até 52% esses investimentos. E, obviamente, haverá uma redução no número de obras contempladas e menos intervenções no reaparelhamento de terminais portuários privados (TUPs) e em novas ferrovias autorizadas pelo governo. No setor ferroviário, as estimativas eram de que o Reporto permitiria manter o custo dos investimentos R$ 3,2 bilhões mais barato em cinco anos.

Pelo lado do governo, as razões para o veto foram baseadas no fato de que o Reporto implicaria em renúncia de receitas, o que iria contra a emenda constitucional que reduz progressivamente incentivos e benefícios federais de natureza tributária. E ainda permitiria a possibilidade de desvios de recursos para outros usos, o que iria contrariar diretrizes do Tribunal de Contas da União (TCU) para a comprovação dos montantes desonerados e o seu respectivo retorno à sociedade.

Em outras palavras: a decisão do governo de aprovar o BR do Mar sem a inclusão do Reporto deixa em dúvida a eficácia que possa ter essa legislação que, a princípio, vem para estimular a navegação entre os portos brasileiros com o objetivo, entre outros, de diminuir a utilização da malha rodoviária. E estabelecer maior equilíbrio na matriz de transporte em que, segundo dados da Confederação Nacional de Transporte (CNT), o setor rodoviário tem a maior participação, sendo responsável por 61% das cargas, ficando o ferroviário com 21%. As demais cargas seguem 12% por cabotagem, 4% por dutos, 2% por hidrovias e menos de 1% pelo modal aéreo.

Ao seguir a argumentação do Ministério da Economia, o veto presidencial representou também um desestímulo ao trabalho desenvolvido pelo Ministério da Infraestrutura, que, afinal, era tido como um dos poucos setores em que o governo vinha se saindo bem. Além disso, pode contribuir para que o País continue fora do radar do investidor externo. Por isso, a esperança que resta é que o veto presidencial seja derrubado pelo Congresso Nacional.


Liana Lourenço Martinelli, advogada, pós-graduada em Gestão de Negócios e Comércio Internacional, é gerente de Relações Institucionais do Grupo Fiorde, constituído pelas empresas Fiorde Logística Internacional, FTA Transportes e Armazéns Gerais e Barter Comércio Internacional. E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: fiorde.com.br

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